1. e4
É este um ótimo lance inicial, e deve ser o preferido pelos que se iniciam em xadrez.
Sua finalidade é ampla:
a) Ocupa importante casa central de seu território (casa e4), ao mesmo tempo em que exerce fiscalização em duas casas do território inimigo (as casas d5 e f5 do adversário). Decorre daí uma vantagem: o inimigo não poderá ocupar essas duas casas de seu campo, ameaçadas que estariam de captura por parte do Peão branco.
b) Concorre, vantajosamente, para o desenvolvimento das peças brancas, por facilitar a saída do Bispo do Rei e da Dama.
Não é uma jogada de ataque, nem de defesa; é um lance neutro, de desenvolvimento.
1... e5Tem as mesmas razões apontadas para o lance anterior.
2. Nf3É lance de desenvolvimento, de ação central, mas também de ataque.
De desenvolvimento, porque o Cavalo em f3 domina oito casas (g1, h2, h4, g5, e5, d4, d2 e e1), enquanto em sua casa inicial dominava apenas três (h3, f3 e e2).
De ação central, porque visa duas casas do centro, d4 e e5.
Lance de ataque, porque ameaça diretamente o Peão em e5.
É a melhor casa de saída para o Cavalo. Inferiores seriam Nh3 (sem ação central) e Ne2, onde dominaria menor número de casas.
Qual é a melhor defesa para o Peão em e5 atacado?O segundo jogador tem um problema agudo para resolver, qual seja o da defesa do seu Peão do Rei atacado.
Quais as defesas diretas possíveis?
São elas:
a) 2... f6; b) 2... d6; c) 2... Qe7; d) 2... Qf6; e) 2... Bd6 e f) 2... Nc6.
Qual a melhor?
a) 2... f6. Embora, aparentemente, resolva a defesa do Peão em e5, não é recomendável porque enfraquece um futuro roque preto (pelo avanço de um Peão do roque e pela abertura da diagonal das Brancas a2-g8 sobre o roque) e também porque priva o Cavalo do Rei de sua melhor casa, que é a casa f6.
Mais ainda, 2... f6 pouco colabora para o domínio central (apenas defende o Peão do Rei atacado) e, em nada coopera para o desenvolvimento. Ao contrário, limita eventual saída da Dama pela diagonal das Pretas d8-h4.
Se não existissem esses motivos posicionais, para repudiar o lance 2... f6, haveria a seguinte continuação tática: 2... f6 3. Nxe5 fxe5 4. Qh5+ g6 5. Qxe5+, seguido de 6. Qxh8, e as Brancas ganham material.
b) 2... d6. Defende o Peão em e5 e permite o desenvolvimento do Bispo da Dama, mas é de pouca ação no centro e obstrui a saída do Bispo do Rei. Por esses inconvenientes não é considerada boa defesa.
c) 2... Qe7. Salta aos olhos o inconveniente deste lance: impede a saída do Bispo do Rei, além de não exercer ação central.
d) 2... Qf6. Priva o Cavalo do Rei de sua melhor casa e se expõe, após o avanço do Peão da Dama branco, ao ataque Bg5 das Brancas. Também sem ação no centro. Não é, pois, defesa recomendável.
e) 2... Bd6. Bloqueia o avanço do Peão da Dama preto, dificultando a saída do Bispo da Dama. É má defesa.
f) 2... Nc6. Defende o Peão em e5 atacado e exerce ação nas casas centrais e5 e d4. Constitui ótimo lance de desenvolvimento; não impede a saída de nenhuma peça de seu lado, domina ainda oito casas.
É por isso a melhor defesa para o Peão do Rei atacado.
2... Nc6
3. Nc3Em sua casa inicial este Cavalo apenas dominava três casas (a3, c3 e d2). Agora, domina oito (b1, a2, a4, b5, d5, e4, e2 e d1). Representa bom lance de desenvolvimento e com ação central nas casas e4 e d5.
3... Nf6Bom lance, pelas mesmas razões acima apontadas.
O conjunto destes três lances de cada lado constitui a Abertura dos Quatro Cavalos (ECO C47), veja o Diagrama 1.
Diagrama 1 - Abertura dos Quatro Cavalos
Posição após 3... Nf6
4. Bb5Em sua casa inicial este Bispo agia em todas as casas de sua diagonal aberta. Agora, age, ainda mais, sobre as casas a4 e c6, onde se encontra um Cavalo inimigo. Com tal saída foi ampliado seu raio de ação, ao mesmo tempo em que tornou possível a realização do roque pequeno. Por esse lado, constitui bom lance de desenvolvimento. Mas é igualmente lance de ataque, porquanto ameaça Bxc6, eliminando a defesa do Peão em e5, que poderá, depois, ser capturado pelo Cavalo inimigo, que atua sobre o centro.
Trata-se, pois, de um bom lance.
4... Bb4O contra-ataque como defesa.Este lance (4... Bb4) surpreende o principiante. Se a ameaça branca era 5. Bxc6, seguido de 6. Nxe5, parecia haver necessidade de defender o Peão em e5, por exemplo, com 4... d6, procurando substituir a defesa, que o Peão em e5 irá perder devido a ameaça 5. Bxc6.
Porém, essa defesa (4... d6) teria o inconveniente de obstruir a saída do Bispo do Rei, e já sabemos, ou saibamo-lo agora, que as peças devem ser desenvolvidas sem prejudicar a saída das peças companheiras.
E o lance do texto (4... Bb4) organiza alguma defesa para o Peão em e5 atacado? A resposta é afirmativa. A jogada 4... Bb4 constitui defesa pelo contra-ataque. Visa eliminar a defesa do Peão em e4, capturando o Cavalo em c3, seguindo-se da captura Nxe4. Se 5. Bxc6, procurando ganhar o Peão em e5, a partida seguiria do seguinte modo: 5... dxc6 6. Nxe5 Bxc3 7. bxc3 Nxe4; e as Pretas recuperariam o Peão.
O lance 4... Bb4 é uma jogada de desenvolvimento, defesa (pelo contra-ataque) e de ação central, pois vulnera uma peça inimiga (o Cavalo em c3), que exerce fiscalização nas casas centrais.
Surgiu, com esse lance, um ensinamento importante: um lance de contra-ataque, substituindo uma jogada defensiva.
5. 0-0O roque deve ser realizado o mais cedo possível.O principiante deve procurar seguir a regra seguinte: “Roque tão logo seja possível e de preferência com a Torre do Rei”.
O roque permite colocar o Rei em segurança e dar jogo à Torre do roque.
Em algumas circunstâncias pode-se realizar o roque com a Torre da Dama, observando um ataque ao Rei inimigo, que tenha rocado com sua Torre do Rei (casos de roques opostos); esse ataque, tendo por base a instalação de peças na ala do Rei.
Em ocasiões mais raras, poder-se-á atrasar, deliberadamente, o roque, aguardando-se as intenções do adversário, para optar-se, conforme o caso, pelo roque em uma das alas.
Entretanto, em 90% dos casos, deve-se procurar rocar, rapidamente com a Torre do Rei (roque pequeno).
5... 0-0Ambos os adversários intercalaram o roque no clima de tensão de luta existente ao redor dos Peões centrais.
6. d3Defendendo o Peão em e4 com outro Peão, ao mesmo tempo em que permite a saída do Bispo da Dama. Trata-se de um lance de desenvolvimento e defesa.
6... d6As razões são as mesmas acima indicadas.
7. Bg5Em sua casa inicial este Bispo apenas controlava as casas de sua diagonal aberta. Agora, age, ainda mais, sobre as casas h4 e f6, onde encontra um Cavalo inimigo. Portanto, lance que ampliou o raio de ação do Bispo do Dama.
O Cavalo do Rei preto ficou cravado, não pode mover-se, sem expor a Dama preta a ser capturada pelo Bispo branco. Trata-se, também de um lance de ataque.
As pretas não temem a captura 8. Bxf6, pois tem resposta adequada, que é 8... Qxf6. Mas a ameaça branca é 8. Nd5, atacando mais uma vez o Cavalo do Rei preto e, após 9. Nxf6+ gxf6 (forçado); 10. Bh6, conseguiriam as Brancas romper a barreira do roque preto, abrindo a coluna g para um ataque. Essa manobra é viável graças à pregadura do Cavalo do Rei preto.
7... Bxc3Uma troca necessária.As pretas descobriram as intenções do adversário, e eliminam o Cavalo, que ameaçava dirigir-se à casa d5, para efetuar a manobra acima estudada. A defesa encontrada pelas Pretas é boa. Ao contrário, combater a pregadura, que o Bispo branco exerce sobre o Cavalo do Rei preto, com 7... h6 8. Bh4 g5, não é recomendável, por enfraquecer esses mesmos Peões, que se movimentaram, e o próprio roque preto. Na maioria das vezes, o Bispo da Dama atacado retrocede a g3, mas, no caso presente, conseguem as Brancas forte ataque, com 9. Nxg5 hxg5 10. Bxg5 Bxc3 (forçado para evitar 11. Nd5); 11. bxc3 Qe7 12. Qf3 Kg7 13. Qg3 seguido de f4.
O principiante encontrará a cada passo, no estudo do xadrez, seqüências de lances, à margem de uma partida, como é o caso acima e, com freqüência, deixa de reproduzi-las, para não desarrumar a posição das peças na partida que segue.
Isso é um erro!
Nesses comentários feitos ao lado das partidas é que se encontram os verdadeiros ensinamentos e que devem ser aproveitados pelos estudiosos.
O ideal seria acompanhar uma partida comentada com dois tabuleiros, reservando-se um para as análises. Dispondo-se, porém, de apenas um tabuleiro, deve-se, do mesmo modo, reproduzir todas as variantes que se apontam e, uma vez estudadas, voltar à partida principal, reproduzindo-se seus lances desde o início.
8. bxc3 Ne7
Diagrama 2 - Posição após 8... Ne7
Evitar enfraquecer o roque.Já sabemos que o roque visa dar jogo à Torre do Rei (no roque pequeno) e colocar o Rei em sítio melhor protegido. Mas, a estrutura do roque deve ser mantida, para não tornar o roque débil, facilmente alvo de ataque.
Os três Peões em, f3, f7, g3, g7, h3 e h7 do roque são o escudo do Rei. Tem força defensiva máxima, por onde o Rei pode vir a ser fatalmente atingido.
Nas considerações do sétimo lance das Pretas (7... Bxc3) vimos um avanço defeituoso e criticável dos Peões do roque, à base de ...h7 e ...g5 e, como pode ser vantajosamente explorado, em alguns casos. Agora, com 8... Ne7 as Pretas permitem a destruição desse escudo real, se as Brancas jogam 9. Bxf6, pois a resposta forçada é 9... gxf6 e resulta daí:
a) Uma coluna aberta sobre o roque preto, por onde podem agir peças inimigas (Damas e Torres).
b) Peões dobrados em f7 e f6, que devem ser evitados, visto constituírem fraquezas.
c) Casas fracas, f6 e h6, onde podem ser instaladas peças adversárias, porquanto desaparece o Peão de g7 que dominava essas casas.
O desaparecimento do Peão de g7 torna acessíveis ao inimigo as casas f6 e h6.
De uma maneira geral os principiantes devem evitar posições semelhantes.
Porém, no caso presente, as Pretas não podem ainda ser criticadas por sua estratégia. Se é verdade que, com a abertura da coluna g, resulta uma via de ataque das Brancas ao Rei preto, verdade é, também, que as Pretas podem utilizar-se dessa mesma via resultando da manobra anterior, para um ataque ao Rei branco.
Com isso em mente é que as pretas permitem, neste momento, a destruição de seu escudo real. Um exemplo seria: 9. Bxf6 gxf6 10. Nh4 c6 11. Bc4 Ng6 12. Nxg6 hxg6 13. f4 Kg7 14. Qf3 Rh8; e as Pretas têm a coluna h aberta à sua disposição.
Mas, essa conduta de permitir a destruição do escudo real é perigosa, e a menor incorreção pode dar origem a uma posição inferior e mesmo perdida.
9. Nh4A abertura das colunas abre jogo às Torres.Para prosseguir com f4 e fazer atuar a Torre do Rei no ataque ao Rei inimigo, pela abertura da coluna f. É uma manobra típica, para aproveitar a ação das Torres.
9... c6Incomodava ao segundo jogador o domínio que o Bispo do Rei branco exercia sobre as casas d7 e e8. Daí a razão de seu último lance.
10. Bc4Dirigir as peças para o lado em que está o Rei inimigo.Porém, a posição deste Bispo é, de novo, esplendida, porque atua sobre a casa f7, duas vezes defendida, é verdade, mas uma das defesas é o próprio Rei. Quer isto dizer que este Bispo está agindo sobre o próprio escudo real.
Teria sido sem significação a retirada 10. Ba4.
10... Be6Tanto era eficiente a ação do Bispo branco em c4, que as Pretas procuram opor-se a sua ação e mesmo eliminá-lo.
11. Bxf6Debilitar o roque inimigo no momento exato.
As Brancas realizam a captura que seu adversário permitira há dois lances atrás, mas fazem-no, agora, no momento exato, sem deixar às Pretas possibilidades de compensação de aproveitamento da coluna aberta.
11... gxf6Retomada forçada. Se 11... Bxc4; com 12. Bxe7 as Brancas ganham uma peça: 12... Qxe7 13. Nf5 seguido de 14. dxc4.
12. Bxe6 fxe613. Qg4+
Diagrama 3 - Posição após 13. Qg4+
Têm grande eficiência os lances que visam mais de um objetivo.Devido a perigosa política de permitir a destruição de seu escudo real (os Peões do roque), encontram-se, agora, as Pretas alvo de ataque.
A barreira de Peões do roque foi destruída, originando-se uma coluna aberta, que nenhuma compensação trouxe às Pretas. Ao contrário, constitui, isso sim, via de ataque para o inimigo.
Com 13. Qg4+, as Brancas alcançaram dois ataques simultâneos, um ao próprio Rei inimigo e outro ao Peão em e6 indefeso (Diagrama 3).
Esses lances, que atingem mais de um objetivo, são altamente eficientes e, freqüentemente, ocasionam vantagem material, quando não restringem o jogo do adversário, pela limitação das respostas.
13... Rf7Forçado para não perder o Peão. Eis o caso de limitação na resposta.
14. f4Com o objetivo de fazer atuar a Torre do Rei na coluna aberta, após fxe5.
14... Rg8A primeira vista, as Pretas conseguiram uma compensação, porquanto sua Torre atua na coluna aberta g, sobre o Rei branco. Mas o jogador das Brancas demonstrará a inconsistência e a fraqueza do roque adversário.
15. Qh5+Outra vez um ataque de duplo objetivo: atacar o Rei e o Peão em h7.
15... Kg7Corre o Rei preto a defender seu Peão. Outro exemplo de limitação de resposta a um lance de dupla finalidade.
16. fxe5Abre-se uma coluna: Torres em ação.O lance das Brancas, que foi bem preparado, dá ao primeiro jogador o controle absoluto da coluna aberta f, por onde atuarão com eficiência suas Torres.
16... dxe5Retomada obrigatória. Se 16... fxe5; as Brancas dariam mate em dois lances, com 17.Rf7+ Kh8 18. Qxh7# (mate). Essa continuação já é suficiente para demonstrar a força da Torre branca, na coluna aberta f.
17. Rxf6
Diagrama 4 - Posição após 17. Rxf6
Sacrifício de todo correto e que tem como base a excelente posição de ataque das peças brancas e a má posição do Rei inimigo, que não mais dispõe de seu escudo protetor (os Peões do roque).
17... Kxf618. Rf1+ Nf5Forçado; se 18... Kg7; novamente haveria mate em dois lances, com 19. Rf7+ Kh8 20. Qxh7#.
19. Nxf5Melhor que 19. exf5, que permitiria a fuga do Rei preto via 19... Re7; com posição igualmente perdida, é verdade, mas daria maior resistência às Pretas.
19... exf520. Rxf5+ Ke7Após 20... Ke6 seguir-se-ia a mesma continuação.
21. Qf7+ Kd6 (Único lance)
22. Rf6+ Kc5Paga o Rei preto pelos seus pecados por desprezar a proteção dos Peões do roque. Como andarilho, morrerá em terras estranhas.
23. Qxb7
Diagrama 5 - Posição após 23. Qxb7
Entregando a Torre, mas que não pode ser tomada pela Dama inimiga, por causa de 24. Qb4#.
Ao mesmo tempo ameaça 24. Rxc6#.
23... Qb6
Única jogada que evita os dois mates apontados, mas...
24. Rxc6+ Qxc6
25. Qb4#
Observar que a Dama preta, ao ocupar a casa c6, tirou ao seu Rei uma casa de fuga.
Esta partida foi jogada na cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos, no ano de 1933, entre o genial mestre cubano José Raul Capablanca (campeão mundial de 1921 a 1927), que conduzia as peças brancas e o americano Herman Steiner.
Foi, realmente, uma partida de exibição, produzida ante grande assistência, sobre um gigantesco tabuleiro, sendo as peças representadas por figuras humanas, com vestimentas de Reis, Rainhas, Bispos, etc. É o que denomina uma partida de xadrez ao vivo.